quinta-feira, 24 de fevereiro de 2011

A Política da Vez: a Nacional de Resíduos Sólidos.

Originalmente publicado na Revista da Associação Brasileira de Pavimentação (ABPv, no. 18, Jul/Ago/Set 2010).
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A coletivização da tutela de Direitos Fundamentais é tema que tem sido freqüentemente debatido nas academias. Nada mais natural, tratar direitos individuais de maneira coletiva beneficia um maior número de pessoas e traz a noção de cidadania mais próxima e palpável para o homem comum.

A Constituição Federal de 1988 concretizou os Direitos Sociais (do trabalho; saúde; educação; etc) e os trouxe para o enfoque de obrigação exigível do Estado, coisa que não era (ou podia ser) feita em tempos não democráticos.

A partir do processo de democratização brasileira, as Políticas Nacionais passaram a ser, de meros programas para guiar o Administrador, fundamento de exigência social.

“Política Nacional” é o nome dado às legislações federais que se destinam a traçar diretrizes e objetivos para que os Direitos Fundamentais de toda espécie, expressos na Constituição Federal, sejam assegurados.

Essa espécie legal traz definições abrangentes que vão desde a estrutura Administrativa para a concretização das Políticas, até a definição de princípios norteadores da conduta pública e privada.

Até aqui foi feito um breve esquema, uma resumida conceituação que, ao leitor não habituado ao Sistema Jurídico, serve para situá-lo na importância do tema título.
Pois bem, são exemplos da espécie normativa a Política Nacional Sobre Drogas; a Política Nacional de Educação Infantil; a Política Nacional de Meio Ambiente, entre outras.

Como se vê, os temas são os mais variados. Posso afirmar que as legislações respectivas são ricas em detalhes, por isso, na teoria, são grandes fontes de solução, ocorre que há um desafio: implementar com eficiência.

A Administração, por sua vez, tem vasto arsenal punitivo assegurar a implementação dos objetivos legais expressos nas Políticas Públicas e, quando falha nessa, ou em outras atribuições, por omissão ou por culpa, há de se provocá-lo judicialmente para cumprir seu dever [1].

Como se vê, há no Brasil todo um sistema lógico para que se alcance a tutela dos Direitos Fundamentais.

Há a norma que impõe e o meio judicial de se exigir do governante e do particular determinada conduta, por eles olvidada ou feita de forma ineficiente.

Pois bem, recentemente, mais precisamente no dia 02 de agosto de 2010, foi sancionada mais uma dessas legislações.

Após vinte e um anos de tramitação no congresso, entra em vigor a Política Nacional de Resíduos Sólidos (Lei Federal no. 12.305/2010).

Trata-se uma lei moderna, aponto dois itens que me causaram maior impacto positivo, justamente por premiar a criatividade e trazer incentivo, não punição, algo raro nas legislações brasileiras.

Primeiramente o que prevê, dentre outras coisas, a logística inversa e a reciclagem (incisos XIV e XII do art. 3º) [2].

Isso porque, a previsão de se impor o reaproveitamento do resíduo se compatibiliza com a noção de sustentabilidade em escala superior à de uma destinação adequada do mesmo.

Essa previsão legal traz à recordação o Termo de Ajuste de Conduta que foi firmado entre o Ministério Público do Estado do Espírito Santo, em Cachoeiro de Itapemirim, com Associações representativas das Indústrias Beneficiadoras de Mármore e Granito, em 2008, onde se exigiu a destinação adequada da lama abrasiva, resíduo proveniente do corte do bloco de granito e polimento das chapas respectivas.

Diante dessa ação do MP Capixaba, surgiu a necessidade premente de se destinar adequadamente toda àquela lama armazenada por anos nos pátios das empresas, sob pena de se impor multas por descumprimento de prazos fixados.

O grande problema que surgiu foi o de que não havia aterros suficientes para abrigar todo aquele resíduo acumulado durante anos.

Foi então que as idéias de reaproveitamento da lama abrasiva ganharam mais notoriedade.

Ora, de resíduo do processo de beneficiamento, a lama abrasiva passaria a ser subproduto para construção civil, inclusive para pavimentação. De problema ambiental, passaria à fonte de renda e empregos.

O resíduo poderia “ser utilizado em pavimentação asfáltica em substituição aos agregados comumente utilizados. Dessa forma, reduz-se o custo do pavimento e contribui-se com as tecnologias limpas.” [3].

Nesse contexto, a grande quantidade de “matéria prima disponível” no Estado do Espírito Santo, o maior produtor mundial de mármore e granito.

Não é a toa que nesse pequeno Estado brasileiro já existe uma Política Estadual de Resíduos Sólidos (Lei Estadual nº 9.264/2009), e que nela está prevista a formação de Subcomitês, que discutirão a realidade de cada setor, entre ele, o de rochas ornamentais.

Voltando à Política Nacional de Resíduos Sólidos, é aí que entra o segundo ponto que chama atenção, há a possibilidade de que os Estados que tiverem Plano Estadual de Resíduos Sólidos confeccionado, o direito de obterem recursos da União [4].

Essa previsão serve para mensurar a dedicação dos governantes com o bem estar da população, algo importante em ano eleitoral.

De todo o exposto, se vê que o povo brasileiro tem à sua disposição, importante instrumento de gestão de resíduos, e que seus dispositivos devem ser de conhecimento geral, objeto, inclusive, de educação escolar.

Somente com cidadãos conscientes é que teremos a cidadania efetiva, a concretização de Políticas Públicas deve passar por sua ampla divulgação.
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Notas:
[1] Essa é atribuição do Ministério Público e até de Associações Civis, que se destinem à tutela ao tema da omissão (Direito do Consumidor; Direito Ambiental; etc), em seu Estatuto Social (vide Lei Federal no. 7.345/1985 – Lei da Ação Civil Pública).
Outros entes também são titulares desse Direito, inclusive o simples cidadão que, através da Ação Popular, pode provocar o Poder Público em função de sua eventual omissão ou ato que se desvirtue da lei.

[2] Logística reversa: instrumento de desenvolvimento econômico e social caracterizado por um conjunto de ações, procedimentos e meios destinados a viabilizar a coleta e a restituição dos resíduos sólidos ao setor empresarial, para reaproveitamento, em seu ciclo ou em outros ciclos produtivos, ou outra destinação final ambientalmente adequada.
Reciclagem: processo de transformação dos resíduos sólidos que envolve a alteração de suas propriedades físicas, físico-químicas ou biológicas, com vistas à transformação em insumos ou novos produtos, observadas as condições e os padrões estabelecidos pelos órgãos competentes do Sisnama e, se couber, do SNVS e do Suasa;

[3] Essa é a conclusão do trabalho “UTILIZAÇÃO DE REJEITOS MINERAIS EM MISTURAS ASFÁLTICAS”, de Roberto Carlos da Conceição Ribeiro; Julio Cesar Guedes Correia e Peter Rudolf Seidl, Contribuição Técnica publicada no XXI Encontro Nacional de Tratamento de Minérios e Metalurgia Extrativa, de 20 a 24 de Novembro de 2005, em Natal, Rio Grande do Norte, Volume 2, págs. 318-325.

[4] Art. 16. A elaboração de plano estadual de resíduos sólidos, nos termos previstos por esta Lei, é condição para os Estados terem acesso a recursos da União, ou por ela controlados, destinados a empreendimentos e serviços relacionados à gestão de resíduos sólidos, ou para serem beneficiados por incentivos ou financiamentos de entidades federais de crédito ou fomento para tal finalidade.

segunda-feira, 21 de fevereiro de 2011

O direito a ser indenizado em lucros cessantes em função de interrupção da mineração por ato do Estado.

A atividade de mineração, como é certo, está sujeita a uma série de obrigações de ordem pública que, por vezes, leva parte dos mineradores a agirem informalmente, o que pode trazer conseqüências de ordem administrativa (multas, embargos, etc), criminal e civil (recuperar área ou indenizar).

Diante dessa constatação, cumpre informar que a regularização administrativa dá segurança jurídica aos empresários, não só evitando as conseqüências acima citadas mas, também, garantindo-lhes direito, como explico abaixo.

Há cerca de um ano o Superior Tribunal de Justiça decidiu de forma coerente em benefício de um minerador de saibro e cascalho de Planaltina, no Distrito Federal.
No caso, o minerador estava quite com todas as obrigações formais para a exploração, procedendo de forma regular.

Ocorre que a área onde se localizava sua lavra foi declarada de utilidade pública para desapropriação com fins de reforma agrária, pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária - Incra.

Como o Incra se imitiu (termo técnico que significa adentrar ao bem, tomar a posse do imóvel)na posse da área, interrompendo a exploração mineral antes do fim do prazo da licença ambiental concedida, o STJ, reformando decisão do Tribunal inferior, reconheceu o direito do minerador em receber os lucros cessantes da atividade, até a data limite da validade da licença.

Esse humilde blogueiro entende que esse tipo de indenização cabe a todo e qualquer tipo de desapropriação feita pelo Estado (aqui entendido todos os entes federados, União, Estado e Municípios), inclusive as que se destinam a formar Unidades de Conservação, construção de vias, enfim, a todo ato estatal que limite uma exploração mineral que esteja regular.